16/06/2013 Entrevista com a Escritora e Contadora de História Rita Nasser |
Entrevista com a Escritora, Contadora de Histórias e Educadora paulista Rita Nasser, que estará em Salvador no próximo dia 06 de julho ministrando a oficina Histórias que contam Histórias. O trabalho de Rita Nasser já é conhecido do público do sudeste, tendo sido objeto da atenção de estudiosos das áreas de Letras, Pedagogia e Artes. Na Bahia, o trabalho da artista foi incluído na pesquisa de doutoramento da Prof. Luciene Santos, docente do Departamento de Educação da Universidade Estadual de Feira de Santana. MB: Começamos nossa entrevista com uma pergunta básica sobre seu trabalho. Por quê as histórias? RN: Muito ainda se discute sobre isso e a discussão vai longe, pelo que vejo, ouço, participo. Vamos lá: Todos somos contadores em potencial. Uns mais, outros menos, com habilidades específicas e estilos diversos. Costumo falar baseada no trabalho que realizo e por ele me considero uma pessoa que tem algo a narrar, apenas isso. Acredito que através das histórias podemos despertar em nós e em outros sentimentos universais e fundamentais, capazes de tornar mais leve o árduo peso da caminhada. RN: Existem inúmeros cursos de pequena e média duração atualmente. Quando comecei, em 1994, pouco havia. Uma ou outra oficina, eventualmente. Percebi que meu caminhar seria longo e buscava tudo o que encontrava pela frente: livros, oficinas, seminários, eventos... Participo de cursos, oficinas, bienais, seminários, palestras desde 1994 e ainda não parei de buscar. Sei que o ser humano nunca está pronto, aprender é uma das minhas metas e sempre será. RN: Migrei da Psicologia para a Educação, fiz pós-graduação em FORMAÇÃO DE PROFESSORES PARA O ENSINO SUPERIOR, Extensão em PSICANÁLISE INFANTIL. Acredito que o que tenho de melhor é meu entusiasmo e minhas ações em aprender e apreender nas coisas que vão além dos muros da universidade, na própria vida e nas histórias que ela no conta desde sempre. RN: Outra grande discussão! Por que tudo deve ter uma função? Quando a “função pedagógica” suprimir o desejo de SER HUMAMO, algo deve sinalizar para a reflexão, urgente! Eu articulo o que vou contar e como vou contar direcionada por muita leitura e pesquisa. Estou preocupada em oferecer diversidade, possibilidade de escape, de encantamento, é isso. Contar histórias é mais importante que tudo. Elas não podem e não devem servir só para ensinar. Rita Nasser MB: O que veio primeiro? A Rita Nasser Educadora, a Escritora ou a Contadora de Histórias? De que forma essas suas três facetas se articulam? RN: Primeiro vem aquela que escuta, depois a Contadora. Que contava para as bonecas, o cachorro, as amigas. Ainda na infância surge a escritora que aos nove anos começa a escrever em homenagem à Monteiro Lobato, para uma comemoração do dia 18 de abril, dia nacional da literatura infantil. Missões proféticas! Na adolescência surge a escritora, que engaveta poesias, como muitas outras meninas de antes. Hoje não sei mais sobre elas (risos). Com a maternidade ressurge a contadora, que permanece e quer também escrever. As três discutem de vez em quando. Mas sempre se entrelaçam, se respeitam. RN: Influencia total. As duas origens são fortemente narradoras. Passei anos ouvindo narrativas verdadeiras e inventadas, maravilhosas. Os mineiros além de serem grandes escritores, tem a facilidade de prosear como ninguém e suas histórias são eternas. Os árabes são os grandes narradores universais, com histórias que tem mais que 1001 noites e dias de beleza e genialidade. Eram histórias que percorriam uma tênue linha entre o imaginário e o real, que me encantavam, me inspiravam. RN: Rótulos são para vender produtos. A boa literatura não deveria ter rótulos. Os livros de Literatura "Infantil" são sim para todos e é a Literatura para adultos que pode ou não ser para todos. Seguindo esta linha de pensamento o livro "para crianças" tem seu espaço como literatura e não é apenas ponte para a formação de leitores. O livro infantil ocupa um lugar de destaque atualmente, que cresce a cada ano. Tanto pela qualidade textual, como pelo projeto editorial; porém o Brasil tem amplitude continental e acredito que muito ainda pode ser feito pelos livros, autores e leitores, facilitando a publicação para autores não tão conhecidos, valorizando as novas propostas, revendo os preços para o consumidor final e apresentando aos leitores o livro como objeto de expressão artística, com abrangência intelectual, humana, psicológica. RN: Não é fácil! Principalmente porque são muitas questões envolvidas, desde o critério para se escolher uma obra a ser produzida, valor artístico (literário), custo da obra, enfim... Ser autora é uma responsabilidade enorme e uma grande alegria. Ser publicadora é que são elas! Costumo dizer que ser autor é bem diferente ser publicado, ser lido, ser recebido num meio tão acirrado. Sou bastante crítica com meu trabalho e vejo que há textos bons e outros nem tanto. Como tenho a possibilidade de contar alguns deles para as crianças, sei exatamente quais agradam e quais não agradam. Essa avaliação que a criança faz é a mais genuína possível e, portanto me impulsiona a caminhar. Neste sentido, a produção independente faz com que uma obra passe a existir concretamente, uma obra na qual acredito, uma história que as crianças gostam e querem ler ou ouvir. RN: O texto nasceu antes, muito antes da ideia do projeto editorial. A história já era contada por mim e, ao observar que as crianças gostavam, ousei um primeiro trabalho independente. Pensei em fazer algo muito simples e que o leitor pudesse se sentir parte da obra, dando vida ao livro. Assim resolvi pedir a ilustradora que fosse retirando os traços das imagens para que o leitor intervisse da forma que ele quisesse, sem predefinições de certo e errado. Mesmo que isso mudasse totalmente a ilustração, afinal o livro agora pertenceria a ele e havia a necessidade de respeitar suas preferências e interferências. Outra ideia foi a de que cada livro fosse único para cada leitor. RN: Isso foi um jogo de palavras, uma brincadeira com Romeu e Julieta, um intertexto para se ampliar o mundo dos pequenos e sugerir novas leituras. O “quase” aparece para superar a impossibilidade diante das coisas que se apresentam complicadas e precisam de persistência, de vontade antes de acontecerem. MB: O seu trabalho como Contadora de Histórias é notável, tem uma característica pessoal, sobretudo pelos métodos e a forma como são explorados certos temas por meio da recorrência à psicanálise. Poderia nos falar um pouco sobre esse aspecto? RN: Sim, caminho para a imaginação e criatividade na hora do contar. Permito que o ouvinte esteja comigo dentro da narrativa, sinta as emoções que ela proporciona através dos seus sentidos, entre no clímax da história e caminhe de volta comigo. Assim ele estará muito mais forte para o enfrentamento da realidade que o cerca. - Ufa! Que bom que tudo acabou bem! Ou - Essa história é triste, mas é linda! Ou coisas mais engraçadas como: - Ele morreu bem morrido! Nesses jogos lúdicos de palavras, que não apresentam sentido aparente, a criança brinca com a linguagem e o som. Sua capacidade de desconstrução e construção da narrativa é muito ágil. Fico maravilhada com essa habilidade dos pequenos que a maioria dos adultos vão perdendo, infelizmente. RN: Há muito tempo eu lia sobre memória dos sentidos e pensei que quando contava histórias muitos sentidos eram estimulados, mas o olfato era pouco explorado. Isso precisava de uma receita, que tivesse também uma história e foi assim... Brinquei com o imaginário e fiz a “receita” que uso em quase todas as minhas apresentações por ser muito bem aceita e divertida. Existe um misto de alegria quando elas ouvem a receita e percebo que muitas não duvidam. Isso é acreditar na possibilidade do sonho, na beleza da infância e seus encantamentos. (http://ritanasser.wordpress.com/) RN: O Rede de Histórias e a reunião dos trabalhos que desenvolvo dentro da narração, estímulos à leitura, criação literária, entre outros. Minha intenção é que essas atividades, esses trabalhos se articulem, dialoguem. Gosto da etimologia da palavra rede que vem do latim retis, significando entrelaçamento, que também dá origem a enredo. Na crença de que existe um grande enredo universal que pode ser melhor estudado, compartilhado, nomeei REDE DE HISTÓRIAS o conjunto desses estudos, cursos, oficinas, produções. RN: O próprio nome já me encanta, “ tecnologias que associam a informação e comunicação”. As TIC’s representam a voz de quem ainda não teve voz. Por isso são muito importantes. Elas quebram as “nossas verdades” e impulsionam novas discussões, sugerem novos pensamentos, buscas, novas descobertas. Seu dinamismo e a rapidez de atualização das informações são essenciais. É um vasto caminho para aqueles que começam a pesquisar e dialogar com outros profissionais e culturas. Funcionam como uma grande vitrine, são excelentes quando bem usadas e se houver um trabalho consolidado anteriormente, só terá efeitos positivos para os usuários. Elas fazem com que a dialética seja muito mais ampla e eficaz, porque permite a discussão de um determinado assunto com pessoas de diferentes formações e visões, em diversos países, isso só contribui! RN: O trabalho é feito diante de editais públicos e somos contratados de acordo com o planejamento da Secretaria da Cultura do Município de São Paulo. Através da Narração ou Contação é que a criança se vê no universo da literatura, e o espaço “biblioteca” estreita o contato do leitor com o livro, estimulando a leitura. Eu sempre envio projetos diferentes, que são selecionados por uma equipe competente. De acordo com o projeto escolhido, elaboro minha forma de apresentá-lo, sempre primando pela palavra, é ela que me conduz. RN: Se todos entendessem como uma nobre função não precisaríamos tocar nesta questão, concorda? “ Tem uma sala encantada clara e perfumada onde acordamos histórias e a porta nunca é fechada.” O espaço da leitura é também espaço de escolha, opção, transporte, espaço de sonho e possibilidades. O livro não é apenas ponte para a formação de leitores. Formar leitores é sim extremamente necessário. A leitura é caminho certo para a formação humana. RN: A oficina é uma forma de redescoberta do narrador adormecido em cada um. Pretende apresentar a minha experiência em narrar de formar e em contextos diferentes. Com recursos internos e externos a serem observados como ferramentas. Acredito que a partir dela, outros olhares irão convergir para este nobre ofício, que é contar. Outrossim, a oficina pretende multiplicar o ator de ler, ouvir e contar histórias, numa REDE sem fim. RN: Quero apenas agradecer a oportunidade e a acolhida e dizer que, se outras histórias não se transformarem em livros, não se preocupem... Elas continuarão a existir pela voz da narradora e encontrarão seus corações.
“Se se quiser falar ao coração dos homens, há que se contar uma história. Dessas onde não faltem animais ou deuses e muita fantasia. Porque é assim, suave e docemente que se despertam consciências.” Jean de La Fontaine, século XVII * Livros publicados: NASSER, Rita. IRINEU E MARIETA, UM AMOR QUASE IMPOSSÍVEL. SP: Edição Especial, 2012. NASSER, Rita. TEM TREM NA LINHA. São Paulo: Mundo Mirim, 2010. NASSER, Rita. A MÁGICA DA FLAUTA. São Paulo: Paulinas, 2009. 2ed. Poetando http://poetandometamorfoses.blogspot.com/ Contar Histórias - http://ritanasser.wordpress.com/ Por Andréia Araújo editora de educação e cultura Permitida a reprodução toda ou em partes desde que mantida a fonte e autoria Fonte: Municipios Baianos
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